ABC publica documento sobre Ciência Aberta
Em 23 de novembro foi lançado um documento da Academia Brasileira de Ciências, delineando a paisagem e fazendo recomendações sobre ciência aberta.
É estimulante ver instituições influentes do meio acadêmico brasileiro avançarem e difundirem a discussão sobre ciência aberta, particularmente neste período de reedificação de algumas das instituições científicas nacionais. Nada impede, naturalmente, que se possa tecer algumas críticas, a maioria das quais pode ser facilmente solucionada.
Nota-se que o documento, produzido por um grupo de trabalho interno, por hora não possui um DOI para ser referenciado pois não se encontra arquivado, não possui uma licença aberta para permitir a difusão, a tradução ou o reemprego de seus conteúdos originais, e não disponibiliza a versão fonte para facilitar o reemprego e a acessibilidade. Também não está disponível em português, língua oficial do país, o que pode limitar seu uso na defesa de políticas científicas nacionais perante atores não acadêmicos, enquanto documentos como este em inglês são abundantes.
Já em termos de conteúdo, é possível observar em alguns temas uma certa falta de “zeitgeist”. Sem querer particularizar, me permito destacar uma questão em ciência cidadã e outra em acesso aberto. Sobre a primeira, o texto apresenta uma visão enviesada do que se passa nas ciênciais sociais, desconhecendo uma possível maioria de correntes internacionalmente vibrantes apoiadas em Pesquisa Ação Participativa, prática surgida do trabalho de Paulo Freire no próprio Brasil, e que são reconhecidas como referência e exemplo para a ciência cidadã nas ciências sociais e humanas mundo afora[1,2].
Quanto ao acesso aberto, o texto omite o importante esforço de coordenação internacional pela dita “via diamante”[3], única que ainda propõe um caminho crível, ainda que desafiador, para acabar com o grotesco desvio mundial de verba pública destinada à ciência imposto pela posição estratégica dos editores hegemônicos. Isso pois a experiência dos últimos 20 anos evidencia que a via das APCs (taxas de processamento de artigos) avançou o acesso, mas amplificou os gastos com publicação e as margens de lucros das grandes editoras, junto a outras mazelas[4,5]. E vale lembrar que a via diamante se inspira de experiências latinoamericanas de infraestruturas públicas mencionadas no texto, como SciELO e Redalyc, cujas revistas infelizmente vem sofrendo pressões diversas para adotar APCs por falta de políticas públicas adequadas.
O lançamento ocorreu durante um webinário com apresentações dos autores seguidas por um rico debate abrangendo desafios humanos e infraestruturais particulares ao cenário brasileiro. O documento e a gravação do webinário podem ser acessados a partir de um post com resumos das intervenções, no site da Academia Brasileira de Ciências: Webinário e lançamento de documento sobre Ciência Aberta.
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